
A sociedade do Anel não inicia a marca de Tolkien, mas consolida seu impacto na cultura pop.
Senhor dos Anéis é um tema delicadíssimo. São milhões de fãs pelo mundo que consomem os filmes de grande bilheteria e número de prêmios, jogos de tabuleiro, jogos para console, brinquedos, roupas, acessórios, músicas, entre outros itens desse vasto universo da Terra Média. Porém, sigo corajoso nas minhas impressões, porque esse blog não foi criado sozinho (Êpaaaa!!!).
Sobre minha relação com esse livro: não foi fácil. Adoro ler, leio vários livros por ano sem muito esforço, mas esse foi especial. Já engatei 3 vezes na leitura desse livro, concluindo apenas na terceira. Sei que muita gente talvez possa se identificar com isso, pois não é um livro 100% palatável, mas reconheço que algumas obras, não somente literárias, exigem uma maturidade do consumidor de entretenimento. Tenho vários exemplos de músicas e filmes que só fui admirar depois de muitos anos, o que foi o caso também dos filmes de O Senhor dos Anéis.
Por quê o livro não é fácil? Não é pelas palavras difíceis, pois o livro é muito bem escrito e, por mais complexa que seja a história, é descrita de forma simples. Não é pelo número grande de personagens, pois acredito que o livro os deixa bem mais definidos do que o filme, por exemplo. É a estrutura. É como se a obra tivesse altos e baixos de ritmo, não de qualidade. Em um momento estamos numa cena completamente curiosa, e depois.. caminhada, trilha, almoço, trilha, caminhada, árvores, barulho estranho, trilha. Isso acontece várias vezes, fora as passagens que não necessariamente trazem algum impacto para o sentido da história, como visitas ou encontros ao longo do percurso. Consegui ler esse livro utilizando metas de páginas (foi necessário) e acreditando em seu potencial pois, apesar do ritmo oscilante, o livro é um deleite na aventura fantástica e nada exagerada de Tolkien.
Se você já assistiu o filme, o livro consegue tornar a história bem mais simples de entender. Isso porque apesar dos fãs amarem os filmes e os livros, A Sociedade do Anel tem MUITA coisa diferente entre os dois, o que é natural pois o filme ficaria com 8 horas de duração se fosse explicar toda a parte mitológica. Justamente isso foi um grande atrativo pra mim: a mitologia, Tolkien se propõe a explicar muito mais sobre o que são os anéis, como foram formados, quais as diferenças entre si, um pouco do passado da Terra Média entre Elfos e Anões, entre outros detalhes. Mas sim, o filme também tem coisas muito bacanas que não aparecem em detalhe nos livros, principalmente explorando as cenas de batalha e o mago Saruman. Por outro lado, alguns personagens INCRÍVEIS, como Tom Bombadil, não aparecem no filme. Algumas coisas que o filme estende e que, ao meu ver, o livro é MUITO melhor: o romance chato de Aragorn não existe (por enquanto), a passagem de Galadriel é bem mais concisa, Frodo não é o personagem passivo e vitimizado do filme, entre outras questões. Então, modificações tiveram seus prós e contras.
É interessante como na leitura desse livro acontecem alguns paradoxos, pois a história é extremamente complexa, lotada de personagens e eventos passados da Terra Média, mas é contada com simplicidade. Isso ajuda e atrapalha. Ajuda pois dá pra acompanhar tranquilamente o que está acontecendo (dedicando certa concentração) e atrapalha às vezes pois os personagens fazem citações a coisas do passado que não necessariamente façamos ideia do que seja, e fazem isso como se estivessem falando de algo super cotidiano, o que de certa forma incrementa o mergulho na experiência.
A obra também é lotada de tom poético. Em várias passagens temos canções, poesias, e uma escrita detalhada sobre a natureza que traz o ar folclórico proporcionado por Tolkien. Com sua mistura de inspirações nórdicas e celtas, Tolkien consegue trazer muito sentimento e uma imersão completa durante a longa viagem que ocorre no livro.
Quanto à história em si, o livro inteiro soa quase como um prólogo, tanto que é bem maior que seus sucessores (eu ouvi um amém?), e acompanha a jornada de Frodo e seus parceiros, que em conjunto com outros formariam A Sociedade do Anel. Apesar de ser de cunho central, o Anel em si obviamente é citado no livro, mas a impressão é de que não é tanto quanto no filme. O livro foca bem mais nas consequências do anel e dos desastres e impactos causados por ele. Esse objeto de poder trará todo o tom sombrio da trama, com ações pautadas em muita ambição. Também temos passagens emocionantes, algumas mortes, discussões e muita filosofia.
Por fim, acho que já podemos chamar esse livro de clássico, né? Pelo menos para a cultura pop, Senhor dos Anéis é um dos grandes marcos e que influencia obras até hoje. Tolkien é um escritor esplêndido que desenvolveu um universo muito rico e deve levar o mérito por isso. Tão isso é verdade que estamos em 2022 e ainda temos coisas sendo produzidas, como a série "Os Anéis de Poder" que irá estrear pela Amazon (e essa publicidade gratuitaaaa?).
Acredito que na dificuldade da leitura do livro revela-se em algo que aos poucos fomos perdendo e Tolkien nos desafia a exercitar: a imaginação. Se você se deixar imaginar os cenários incríveis junto com suas criaturas únicas, A Sociedade do Anel será uma ótima experiência, assim como foi pra mim. Tolkien reúne amizade, morte e filosofia nesse ótimo início de trilogia.
"Nem tudo o que reluz é ouro,
Nem todos os que vagueiam estão perdidos;
O velho que é forte não murcha,
Raízes profundas não são atingidas pela geada.
Das cinzas um fogo deve ser acordado,
Uma luz das sombras brotará;
Renovada será a lâmina que estava quebrada,
O sem coroa novamente será rei."
- "Carta de Gandalf", J. R. R. Tolkien

Amém!